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Toddy & Nescau

Eu não pensava em ter cachorro, juro! Achava que seria um gasto desnecessário, meu filho não queria de jeito nenhum e ainda por cima o que eu mais preso é a minha liberdade! E foi justamente por isso que minha psicóloga me recomendou que eu pegasse um: para trabalhar a minha relação com a dependência. Mas que relação, a minha ojeriza de depender de alguém ou ter alguém dependendo de mim.


Eu queria novos amigos, novas oportunidades de trabalho, novas parcerias, mas sem sujeição até que me dei conta de que isso não existe! Dã! Entendi que enquanto eu continuasse desprendida de tudo não iria atrair nada que fosse verdadeiro, duradouro e até, por vezes, inconveniente. Eu estava indo em contra daquilo que queria atrair, colocando energia no que não estava alinhado com o que eu queria materializar.


Então fui lá e gastei o que não devia, comprei a briga com meu filho, tirei todos os tapetes da sala e batizei meus móveis com marcas de dente. Me arrependi, pensei em devolver, achei que nunca mais ia poder viajar ou que fosse me engasgar com a quantidade de pum que ela solta.


Faz 4 meses que a Nescau está aqui e toda vez que tenho que ir embora do rolê para não deixar ela sozinha me sinto completa. Não presa como havia imaginado, mas sim tomada pela cumplicidade, pelo companheirismo e pela alegria que ela me dá.


Por conta dela fiz novos amigos, tenho novos interesses e sou obrigada a sair de casa mesmo quando quero me entregar à preguiça no sofá.


Ela foi a melhor coisa que me aconteceu nos últimos tempos. Me fez assumir responsabilidade e fazer coisas que não são para meu benefício próprio. Meu filho depende de mim, mas depende do pai também – e devo confessar que o pai faz muito mais por ele do que eu. Ou seja, até com a minha cria eu era desprendida! E mesmo assim ainda passei um ano sofrendo por um cara que não quis ficar comigo... entende o conflito? Quero, mas não quero, ou só quero em certas áreas da vida, mas não em tudo... A vida não é assim. Atraímos aquilo que somos. Como eu poderia atrair novas relações se estava repelindo vínculos?


Mas estas não foram as únicas razões pelas quais eu peguei a Nescau.


Eu tenho uma certa energia masculina. Sou daquelas que vai e faz, nunca pede ajuda, só chora quando está sozinha e não reclama de coisas bobas. Nas ocasiões de encontros com casais héteros eu sempre ficava na roda dos homens. Mesmo sem entender de futebol ou de carros, preferia ficar boiando com eles que ouvindo as mulheres reclamando dos maridos, falando dos filhos ou debatendo a melhor dieta. Deus foi muito bom comigo dando-me um filho. Eu não teria a menor paciência para fazer penteado, comprar maquiagem ou ver desenho de princesa. Aí eu fui lá e me desafiei, fazendo o oposto do que me é natural: escolhi uma cachorra fêmea.


No meu próprio processo de materialização eu entrei em contato com certos traumas e feridas da minha infância que se manifestam até hoje e me impedem de materializar uma vida adulta, com prosperidade, autonomia e maturidade. Todos temos uma criança interior que aparece quando gatilhada e a minha sempre vinha no abandono e na rejeição. No amor ou no trabalho, quando recebia um não era possuída pelo comportamento da menina de 15 anos que não tinha amigos, ou da de 9 que foi rejeitada na nova escola ou até daquela na barriga da minha mãe testemunhando a discussão de um possível aborto.


A minha criança interior – chamo ela de Nietinha – precisava ter recebido mais colo, mais abraço, mais aconchego. Ela precisava ter sido mais mimada, ganhado mais presentes, ter se enfeitado mais. Na minha criação foi tão importante fazer que a gente esquecia de só ser. Quando a Nescau pula em mim eu a pego no colo, beijo, agarro, espremo, faço cafuné e dormimos de conchinha à tarde. Eu projeto nela a Nietinha e lhe dou tudo o que gostaria de ter recebido.


Nunca imaginei que eu seria capaz de sentir isso. Não é amor incondicional – este é só de pais para filhos – e talvez nem seja amor de fato, mas sim um laço. Que ata reconhecimento com dedicação, atenção com respeito e carinho com sensatez.

 
 

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