Pertencer a quem?
- Maria Antonieta Lemos
- 5 de abr. de 2022
- 2 min de leitura
Será que reclamamos dos nossos maridos porque não os amamos ou será que fazemos isso porque todo mundo também faz? E se meu marido lavar a louça sobre o que vou conversar com a amiga que tem que fazer tudo na casa? Será que a gente age de maneira automática só para pertencer a um grupo, a uma conversa ou a um padrão? Será que o preço do nosso ingresso é a conformidade? Nos diminuir para sermos iguais?
Durante o primeiro ano de vida do meu filho ele dormia a noite inteira. Tínhamos que acordá-lo para dar de mamar e, preocupados, perguntamos para a pediatra se estava tudo bem. Ela disse que sim, mas que não deveríamos contar isso para ninguém. Na hora não entendi, mas era uma piada. Se outros pais soubessem que nosso filho dormia a noite inteira iam ficar com inveja.
Quando eu era pequena, minha tia-avó ia sempre aos Estados Unidos trazer coisas para vender aqui, a famosa muamba. Para nós, levar e buscar ela no aeroporto era um evento! Eu me lembro uma vez que eu me arrumei toda para ir busca-la: vestido, brincos, colares, batom, tiara, tudo o que você possa imaginar. Estava me sentindo o máximo e aí minha mãe – com a melhor das intenções – disse que se eu fosse daquele jeito todo mundo ia ficar olhando para mim. Hoje em dia eu tenho caixas cheias de acessórios, mas não uso nenhum. Freud explica?
Isso sem falar nas roupas que já comprei porque as meninas bacanas da escola estavam usando, os lugares que fui com amigos sem querer ter ido, as coisas que falei só para agradar e as vezes que me calei para não incomodar.
Porque a gente tenta se encaixar em lugares que são pequenos demais para nós? E se, ao invés de querer pertencer à turma dos melhores alunos, das mães elegantes, dos executivos workaholics ou das garotas fitness, a gente quisesse pertencer a nós mesmos? Porque a gente se abandona para não abandonar a um grupo que a gente nem sabe se tem a ver mesmo com a gente? Se eu falar o que penso as pessoas continuarão gostando de mim?
Todos os dias eu tento olhar mais para dentro e menos para fora. Não tem sido fácil porque não concordar faz a gente se destacar quando, muitas vezes, morremos de medo de ser vistos. Mas cada dia sinto que consigo melhorar um pouquinho. Vou tentando falar um não sem ter que inventar uma desculpa, ficar em casa quando não tenho vontade de malhar ou sair para jantar de roupa de ginástica. E assim, bem devagarzinho, vou construindo minha autenticidade e destruindo minhas amarras.


